Quando Marília Mendonça encontra Nietzsche

Alexandre Dias
3 min readJan 13, 2021

--

Letra da artista traz conceito da obra do filósofo alemão.

Calma. Eu sei que você veio aqui pelo título do texto. Talvez, assim como muitos, você não consiga ver correlação entre uma letra sertaneja e um filósofo famoso e tão estudado como Friedrich Nietzsche. Como é possível que haja algum paralelo entre ambos? (Este pensamento, aliás, é um tanto elitista, mas não vou entrar nos pormenores agora). Enfim, fique, irei te explicar.

Mas, antes, é preciso um pouco de teoria para você entender o lugar em que quero chegar com esse texto.

Nietzsche foi um filósofo alemão da metade do século 19 e início do 20 (Morreu em 1900, se você quiser discutir sobre em que ano começa realmente o século 20, recomendo sair daqui, pouco me interessa).

A obra de Nietzsche pode ser classificada em três períodos: de 1870 a 1876, cujas principais ideias advinham da influência de Schopenhauer; de 1876 a 1882, onde já se evidenciava a construção de um pensamento filosófico próprio e a criação de sua identidade metodológica e, por fim, de 1882 a 1889, seu auge intelectual, o período de maior produção.

Em o Crepúsculo dos Ídolos (é essa obra que mais nos importa) escrita em 1888, Nietzsche, grosso modo, constitui uma introdução à sua filosofia, na medida em que tenta quebrar um paradigma filosófico, questionando a legitimidade de ícones do pensamento humano. A crítica recaí, principalmente, ao modo como a sociedade passou a se pautar na criação de modelos ideais em detrimento do real, e nenhuma frase sintetiza mais seu pensamento sobre o assunto que essa:

O homem inventou o ideal para negar o real”

Ok. Mas o que diabos isso tem a ver com a Marília Mendonça?

Pois bem, partindo de uma análise de uma letra da compositora De quem é a culpa?, observa-se a estória de uma personagem que se questiona de quem realmente é a culpa por ela se apaixonar pelo objeto de seu amor.

“A culpa é sua por ter esse sorriso
Ou a culpa é minha por me apaixonar por ele?”

Constata-se, mais adiante, em uma frase, o ponto em que a teoria do Nietzsche sobre a criação de ídolos converge diretamente com a canção:

“Me apaixonei pelo que eu inventei de você”

A personagem da canção interroga-se durante o seu trajeto reflexivo se o fato dela ter se apaixonado não passa de uma criação do modelo ideal do objeto do seu amor. A partir do momento que ela afirma que o fato dela se apaixonar pelo que ela inventou ( ou seja, a idealização do seu objeto, ou, o seu desejo) observamos, claramente, a convergência entre uma das teorias de Nietzsche e Marília Mendonça.

Aliás, a cantora não esconde em sua obra a influência do filósofo alemão. Suas letras, constantemente, giram em torno de teorias com paralelos com o filósofo. Mas este é assunto para outros textos.

--

--

Alexandre Dias
Alexandre Dias

Written by Alexandre Dias

Jornalista que ama escrever o que pensa, independentemente das sensibilidades do auditório.

No responses yet